CEO do clube aponta falha que comprometeu 25% da base de assinantes, mas para especialista, mercado mais racional e competitivo vai eliminar modelos “frágeis”
Por Bruno Mello e Bruno Garcia | 22/04/2013
bruno.garcia@mundodomarketing.com.br
Na última sexta-feira, 19, o mercado foi surpreendido pela notícia do encerramento das operações do Shoes4You, clube de assinaturas online para sapatos pioneiro no segmento. O fato é representativo porque representa uma nova fase para o e-commerce nacional. Após alguns anos de certa euforia, quando muitas empresas foram criadas obtendo altos investimentos de maneira relativamente fácil, 2013 se apresenta como um período em que os modelos de negócios em teste, as execuções mal feitas, o custo Brasil e a competitividade vão cobrar o seu preço.
O cenário pode ser mais crítico para startups que testam novos modelos de negócio. Lançado no final de 2011 e com 15 mil assinantes cadastrados, o clube de assinatura encerrou 2012 divulgando em seu balanço um faturamento de R$ 5,5 milhões. A empresa também recebeu aportes de investimentos (entre os fundos estão a Accel Partners, Redpoint Ventures, Flybridge Capital Partners e IG Expansión), mas nem isso impediu que seus sócios decidissem por fechar as portas. Agora, eles têm a missão de liquidar a empresa, um estoque de 15 mil pares de sapatos em 10 dias e recuperar aos investidores parte do valor que foi aplicado.
Inicialmente, um problema no sistema de pagamento seria a causa para o fechamento. “Nossa plataforma previa a venda de sapatos que custam cerca de R$ 150,00 a R$ 300,00 por R$ 99,00 com a assinatura. Mas uma parte de clientes da base descobriu que poderia negar a transação diretamente com o banco, mas continuar como sócio em nosso sistema e pegando os sapatos. Ou seja, essas pessoas ganhavam os produtos e nós perdemos esta receita. Isso era algo imprevisível e muito particular do Brasil”, explica Olivier Grinda, CEO da Shoes4You, em entrevista ao Mundo do Marketing. Olivier também é co-fundador do Brandsclub e do ClickOn (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Fragilidade no modelo e na operação
Do total de assinantes do clube, 25% estavam comprometidos pela falha. Por não haver uma comunicação clara dos bancos, a Shoes4You alega não ter percebido o problema. “Pensamos que seria apenas uma falha de pagamento ou de transações, mas não se desconfiou. As instituições bancárias não passam estas informações com facilidade. Como não estávamos conseguindo cobrar do cliente, ao invés de desligá-lo e pensando que estavam agindo de boa fé, ainda procuramos oferecer descontos e outros benefícios. Na nossa cabeça, eles estavam sendo prejudicados por uma falha no sistema”, explica Olivier.
O resultado foi um prejuízo para o clube, o que inviabilizou a sua operação no curto prazo. A empresa chegou a cogitar a transformação em uma loja de sapatos femininos nos moldes tradicionais, mas a ideia acabou descartada. “Se fizéssemos isso, seríamos apenas mais um e este nunca foi o objetivo. O modelo de assinatura se tornou insustentável porque a matemática é simples: custa entre R$ 80,00 e R$ 100,00 para ganhar um cliente. Com o problema em 25% da base, o meu custo por cliente sobiu para cerca de R$ 125,00. Se temos uma margem de apenas R$ 20,00 por transação, o meu ROI se torna negativo”, diz o executivo da Shoes4You.
A questão da cobrança, contudo, pode mascarar uma falha no planejamento. “É muito estranho. Talvez eles tenham subestimado o volume dos cancelamentos, mas o problema operacional é de responsabilidade de quem está no comando da gestão. É preciso prever este tipo de coisa e deveria fazer parte do modelo de negócios. É assim em qualquer empresa. Não posso afirmar que esta foi a causa, mas é uma possibilidade”, comenta Pedro Guasti, Diretor Geral da e-bit e Vice-Presidente do Grupo Buscapé (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Dinheiro está mais escasso, o que exige negócios sustentáveis
A dificuldade da Shoes4You de se manter de pé expõe uma nova fase do e-commerce Brasileiro. Nos tempos atuais, o dinheiro de fundos e de venture capital vem se tornando mais exigente e não tão eufóricos. “Não que a euforia tenha acabado por completo, mas reduziu a temperatura. Continuam existindo investidores querendo colocar dinheiro em novos negócios, mas a questão é que os fundos buscam formatos mais sustentáveis. Também diminuiu a velocidade destes investimentos, pois eles estão mais seletivos e conscientes”, avisa Pedro Guasti.
Para as startups, o risco acaba sendo maior por serem empresas que testam novos modelos de negócio. O mesmo não acontece com as grandes marcas de varejo que operam no ambiente online. Mesmo elas, no entanto, estão mudando o foco de suas ações: se antes o objetivo era aumentar a base de clientes, hoje torna-se cada vez mais importante aumentar a rentabilidade. “São situações bastante diferentes. Para as lojas que estão trabalhando com o conceito de omnichannel, a situação é outra. Acho pouco provável que isso aconteça com elas. Mas mesmo estas lojas abriram mão de continuar crescendo acima do mercado e passaram a buscar rentabilidade. Crescimento sem rentabilidade não é mais uma alternativa”, aponta o VP do Grupo Buscapé em entrevista ao portal.
A situação da Shoes4You reforça esta nova posição dos investidores em busca de negócios que sejam capazes de entregar resultado mais rapidamente. O duro aprendizado pode sinalizar também que haverá um número menor de empreendedores “turistas” daqui por diante. “Todos se empolgaram com o Brasil, pois estavam olhando somente para a receita. Porém, ninguém estava olhando para os custos. Como o dinheiro estará mais difícil de ser captado, os empreendedores turistas serão excluídos e os modelos de negócios que não forem realmente sustentáveis também vão desaparecer, restando apenas as empresas mais fortes e saudáveis. Acredito que faz parte do processo, mas claro, é ruim para aqueles que estão fechando ou ainda vão fechar as suas portas”, diz Olivier Grinda, CEO da Shoes4You, em entrevista ao portal.
Custo Brasil também é uma causa
Além de investidores mais rigorosos, problemas referentes à legislação, tributos, logística e estrutura são indicados como grandes ameaças aos novos empreendimentos como a Shoes4You. Embora não tenha sido apontado como causa para o encerramento das operações, o chamado custo Brasil é citado por Olivier Grinda como uma barreira aos entrantes no mercado digital. “Muitos entram imaginando que os custos fixos serão pagos em razão do crescimento da empresa. Todos sabiam que o custo era alto, mas ninguém imaginava que seria tão alto. A empresa imagina que atingirá o break even ao bater US$ 2 milhões de faturamento. Mas quando atinge este patamar, descobre que na realidade precisa chegar a US$ 5 milhões, e por aí vai”, alerta o CEO da Shoes4You.
Em alguns casos, a falta de escala encarecem o funcionamento dos novos negócios, o que se torna um ponto crítico para startups que ainda estão testando o seu modelo de negócios. “Nos Estados Unidos, são cinco dias para abrir uma empresa e apenas duas pessoas podem tocá-la. Aqui são quase três meses e um investimento alto para manter uma equipe básica que vai operar um e-commerce, por exemplo. Isso faz uma diferença logo de cara, pois o início do negócio é seriamente prejudicado”, afirma Olivier Grinda (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Estes fatores unidos fazem com que o mercado online esteja menos aquecido a partir de agora. “O Brasil já esteve nesta onda, quando muitas empresas queriam apostar no país para crescer. Hoje percebemos que muitos entenderam a realidade do nosso mercado, que é extremamente complexo, tem muita interferência do governo, problemas legais, fiscais, e quando se pega uma empresa internacional, o custo Brasil, problemas de estrutura e questões tributárias realmente são um obstáculo”, acrescenta Pedro Guasti (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Estudos + Mundo do Marketing: E-commerce, oportunidades no canal que mais cresceu nos últimos anos: O comércio eletrônico é o canal que mais cresce no mundo. Mesmo assim, ainda há espaço para muito desenvolvimento. Acesse aqui.
O cenário pode ser mais crítico para startups que testam novos modelos de negócio. Lançado no final de 2011 e com 15 mil assinantes cadastrados, o clube de assinatura encerrou 2012 divulgando em seu balanço um faturamento de R$ 5,5 milhões. A empresa também recebeu aportes de investimentos (entre os fundos estão a Accel Partners, Redpoint Ventures, Flybridge Capital Partners e IG Expansión), mas nem isso impediu que seus sócios decidissem por fechar as portas. Agora, eles têm a missão de liquidar a empresa, um estoque de 15 mil pares de sapatos em 10 dias e recuperar aos investidores parte do valor que foi aplicado.
Inicialmente, um problema no sistema de pagamento seria a causa para o fechamento. “Nossa plataforma previa a venda de sapatos que custam cerca de R$ 150,00 a R$ 300,00 por R$ 99,00 com a assinatura. Mas uma parte de clientes da base descobriu que poderia negar a transação diretamente com o banco, mas continuar como sócio em nosso sistema e pegando os sapatos. Ou seja, essas pessoas ganhavam os produtos e nós perdemos esta receita. Isso era algo imprevisível e muito particular do Brasil”, explica Olivier Grinda, CEO da Shoes4You, em entrevista ao Mundo do Marketing. Olivier também é co-fundador do Brandsclub e do ClickOn (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Fragilidade no modelo e na operação
Do total de assinantes do clube, 25% estavam comprometidos pela falha. Por não haver uma comunicação clara dos bancos, a Shoes4You alega não ter percebido o problema. “Pensamos que seria apenas uma falha de pagamento ou de transações, mas não se desconfiou. As instituições bancárias não passam estas informações com facilidade. Como não estávamos conseguindo cobrar do cliente, ao invés de desligá-lo e pensando que estavam agindo de boa fé, ainda procuramos oferecer descontos e outros benefícios. Na nossa cabeça, eles estavam sendo prejudicados por uma falha no sistema”, explica Olivier.
O resultado foi um prejuízo para o clube, o que inviabilizou a sua operação no curto prazo. A empresa chegou a cogitar a transformação em uma loja de sapatos femininos nos moldes tradicionais, mas a ideia acabou descartada. “Se fizéssemos isso, seríamos apenas mais um e este nunca foi o objetivo. O modelo de assinatura se tornou insustentável porque a matemática é simples: custa entre R$ 80,00 e R$ 100,00 para ganhar um cliente. Com o problema em 25% da base, o meu custo por cliente sobiu para cerca de R$ 125,00. Se temos uma margem de apenas R$ 20,00 por transação, o meu ROI se torna negativo”, diz o executivo da Shoes4You.
A questão da cobrança, contudo, pode mascarar uma falha no planejamento. “É muito estranho. Talvez eles tenham subestimado o volume dos cancelamentos, mas o problema operacional é de responsabilidade de quem está no comando da gestão. É preciso prever este tipo de coisa e deveria fazer parte do modelo de negócios. É assim em qualquer empresa. Não posso afirmar que esta foi a causa, mas é uma possibilidade”, comenta Pedro Guasti, Diretor Geral da e-bit e Vice-Presidente do Grupo Buscapé (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Dinheiro está mais escasso, o que exige negócios sustentáveis
A dificuldade da Shoes4You de se manter de pé expõe uma nova fase do e-commerce Brasileiro. Nos tempos atuais, o dinheiro de fundos e de venture capital vem se tornando mais exigente e não tão eufóricos. “Não que a euforia tenha acabado por completo, mas reduziu a temperatura. Continuam existindo investidores querendo colocar dinheiro em novos negócios, mas a questão é que os fundos buscam formatos mais sustentáveis. Também diminuiu a velocidade destes investimentos, pois eles estão mais seletivos e conscientes”, avisa Pedro Guasti.
Para as startups, o risco acaba sendo maior por serem empresas que testam novos modelos de negócio. O mesmo não acontece com as grandes marcas de varejo que operam no ambiente online. Mesmo elas, no entanto, estão mudando o foco de suas ações: se antes o objetivo era aumentar a base de clientes, hoje torna-se cada vez mais importante aumentar a rentabilidade. “São situações bastante diferentes. Para as lojas que estão trabalhando com o conceito de omnichannel, a situação é outra. Acho pouco provável que isso aconteça com elas. Mas mesmo estas lojas abriram mão de continuar crescendo acima do mercado e passaram a buscar rentabilidade. Crescimento sem rentabilidade não é mais uma alternativa”, aponta o VP do Grupo Buscapé em entrevista ao portal.
A situação da Shoes4You reforça esta nova posição dos investidores em busca de negócios que sejam capazes de entregar resultado mais rapidamente. O duro aprendizado pode sinalizar também que haverá um número menor de empreendedores “turistas” daqui por diante. “Todos se empolgaram com o Brasil, pois estavam olhando somente para a receita. Porém, ninguém estava olhando para os custos. Como o dinheiro estará mais difícil de ser captado, os empreendedores turistas serão excluídos e os modelos de negócios que não forem realmente sustentáveis também vão desaparecer, restando apenas as empresas mais fortes e saudáveis. Acredito que faz parte do processo, mas claro, é ruim para aqueles que estão fechando ou ainda vão fechar as suas portas”, diz Olivier Grinda, CEO da Shoes4You, em entrevista ao portal.
Custo Brasil também é uma causa
Além de investidores mais rigorosos, problemas referentes à legislação, tributos, logística e estrutura são indicados como grandes ameaças aos novos empreendimentos como a Shoes4You. Embora não tenha sido apontado como causa para o encerramento das operações, o chamado custo Brasil é citado por Olivier Grinda como uma barreira aos entrantes no mercado digital. “Muitos entram imaginando que os custos fixos serão pagos em razão do crescimento da empresa. Todos sabiam que o custo era alto, mas ninguém imaginava que seria tão alto. A empresa imagina que atingirá o break even ao bater US$ 2 milhões de faturamento. Mas quando atinge este patamar, descobre que na realidade precisa chegar a US$ 5 milhões, e por aí vai”, alerta o CEO da Shoes4You.
Em alguns casos, a falta de escala encarecem o funcionamento dos novos negócios, o que se torna um ponto crítico para startups que ainda estão testando o seu modelo de negócios. “Nos Estados Unidos, são cinco dias para abrir uma empresa e apenas duas pessoas podem tocá-la. Aqui são quase três meses e um investimento alto para manter uma equipe básica que vai operar um e-commerce, por exemplo. Isso faz uma diferença logo de cara, pois o início do negócio é seriamente prejudicado”, afirma Olivier Grinda (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
Estes fatores unidos fazem com que o mercado online esteja menos aquecido a partir de agora. “O Brasil já esteve nesta onda, quando muitas empresas queriam apostar no país para crescer. Hoje percebemos que muitos entenderam a realidade do nosso mercado, que é extremamente complexo, tem muita interferência do governo, problemas legais, fiscais, e quando se pega uma empresa internacional, o custo Brasil, problemas de estrutura e questões tributárias realmente são um obstáculo”, acrescenta Pedro Guasti (veja a entrevista completa exclusiva para assinantes aqui).
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