Em entrevista ao Administradores.com, Tomi Ahonen – um dos maiores especialistas do mundo em mídias móveis – diz que a popularização dos aparelhos de comunicação móveis fortalece a democracia e cria novas oportunidades de negócio
Hoje um indivíduo com um smartphone na mão pode ter mais poder do que tinha o governo dos EUA com todos os seus computadores nos anos 1950. A afirmação é auspiciosa, mas seu autor a defende com bastante convicção e apresenta fortes argumentos para isso.
Em entrevista ao Administradores.com, Tomi Ahonen – ex-diretor do Departamento de Consultoria Global de Negócios 3G da Nokia e um dos maiores especialistas em mídias móveis do mundo – afirma que a popularização dos aparelhos de comunicação móveis fortalece a democracia, dando como exemplo as revoluções no Oriente e a implementação de serviços cidadãos através de celulares em países de tradição democrática consolidada.
Além disso, ele destaca que a explosão da comunicação móvel cria novas oportunidades de negócio, e garante que o futuro está nesse segmento.
Você diz que o futuro é mobile. Por quê?
Boa pergunta. No começo, a indústria da comunicação e a mídia eram eletrônicas. Agora, são digitais. Nesse processo, se tornaram multimídia e agora estão se tornando interativas. E mobilidade é isso. A televisão é eletrônica, sim. Ela é multimídia, sim. Mas não é tão boa em interatividade. Já a Internet é ótima nisso, mas ainda não está em todo lugar com os dispositivos tradicionais. Mobilidade é, então, a transformação que vem acontecendo. Cada vez mais é por meio dos aparelhos móveis que fazemos nossa primeira comunicação. Se fazemos algo interessante, na hora tiramos fotos. Pelo celular, usamos a internet para carregar jogos ou ler alguma notícia. Nós podemos fazer isso com diferentes dispositivos, podemos ligar o rádio, pegar o vídeo game, tanto faz. Mas o celular é o dispositivo de comunicação que não largamos. Gostamos de enviar mensagens. Então, quando o dispositivo que usamos para isso ganha uma câmera, a partir de então, essa será nossa câmera preferida. Se ganha uma tela, essa se torna nossa tela preferida. Se ganha funções de interatividade, a partir desse momento, se torna nosso principal dispositivo de comunicação multimídia.
Tomi Ahonen, um dos maiores especialistas em mídias móveis do mundo (Foto: Simão Mairins/Administradores.com) |
Você diz que hoje nós temos mais poder com um celular na mão do que os Estados Unidos tinham com imensos computadores, há 50 anos. O que esse poder significa?
Esse é um ótimo ponto. Se olharmos para o cálculo tradicional do poder da computação, o foco está no poder de processamento, quantos milhões, bilhões de contas ele pode fazer. Então, desde cedo, os computadores foram capazes de realizar muitos cálculos por segundo. E hoje nós temos esses milhares de cálculos em um pequeno celular. Nós temos a mesma memória que um computador cujo uso dependia de um centro bem equipado com ar condicionado, onde eles recebiam uma placa refrigerada, cheia de memória, que era destinada apenas para ler e calcular, ler e calcular. Então, se você medir o poder do computador, você será confrontado por um Iphone que é mais poderoso que qualquer computador do planeta, há 20 ou 40 anos, e ainda pode ser levado a qualquer lugar.
E para os negócios, o que esses avanços tecnológicos significam?
Se você pensar sobre os primeiros computadores, vai ver que eles foram inventados para a ciência espacial, energia e bombas nucleares. Eles foram usados para espionagem. Hoje, os computadores mais poderosos do mundo estão com as equipes de Fórmula 1, e são eles que fazem o design dos carros de corrida. Nós estamos usando celulares para nos habilitarmos e computadores para criar filmes como Avatar. Computadores já foram "coisa séria", exclusividade de militares, segurança nacional, você sabe, emergências. A nossa geração substitui esse uso pelo entretenimento. Fazer filmes, propagandas e até as músicas soarem melhor. Se você pensar nos telefones celulares, nós sabemos que eles podem fazer filmes em três dimensões, assim como Avatar. Nós podemos ter filmes curtos e torná-los magníficos no nosso bolso. Então, nós estamos usando o poder da computação para nos entreter. Nós não precisamos calcular.
Você acredita que milhões de pessoas, cada uma com um smartphone na mão, são mais fortes que um governo em posse de um super computador?
Sim, e eu acredito que temos o exemplo perfeito. Observe a Primavera Árabe. Telefones celulares não criaram o movimento, assim como não criaram a revolução Occupy Wall Street. Revoluções são com a Francesa, a Comunista, a Russa. Revoluções sempre existiram. Mas o celular permite às pessoas dizerem "a polícia está chegando", "vamos nos encontrar nas ruas" ou "agora vamos ao banco". Permite que as pessoas se comuniquem instantaneamente. Aparelhos telefônicos simples, no nosso bolso, já estão preparados para o caso de um policial bater em um jornalista. Alguém poderá fotografar ou filmar rapidamente e isto chegará ao presidente com a frase "veja o que os policiais estão fazendo". Telefones celulares estão viabilizando uma nova democracia, mais realista, humana, onde todos de fato se envolvem. A existência desses aparelhos permite o acesso à democracia pelas pessoas. Elas podem controlar a hostilidade do governo com a população.
O mercado e as empresas precisam se preparar para lidar com esse tipo de democracia?
Eu acredito que isso mostra a maturidade do governo e da democracia. Por exemplo: para alguns países, a democracia é algo novo e o governo está com medo, São lugares como a China, Coréia do Norte, Irã, entre outros. O governo tenta sufocar a comunicação entre as pessoas, mas se por acaso você for à Coréia do Sul você conhecerá o sistema de comunicação que liga o governo e a população. Lá se você cair em um buraco na rua é possível ligar diretamente para o órgão responsável e exigir que seja feita uma manutenção. Imagine você em São Paulo, na mesma situação, mandando mensagem para o responsável pela rua e recebendo dele uma resposta imediata, já que é digital e você tem uma gravação da reclamação da pessoa. O problema seria resolvido e você receberia uma mensagem de volta com os agradecimentos. Se os governos assumirem uma postura positiva em relação às novas tecnologias, eles estarão aproveitando uma grande oportunidade.
O que falta para as regiões menos desenvolvidas chegarem a esse nível mencionado, em que as mídias digitais são úteis. Como podemos chegar lá e por que ainda não chegamos?
É fácil olhar para a Apple, seus computadores, iPads, iPhones e pensar: esse é o futuro. Não é. Para a maioria das pessoas, principalmente nos países emergentes onde o maior dispositivo digital é o celular, e não é um iPhone ou Blackberry, é apenas um Nokia simples e barato, ou Motorola, LG. Nós precisamos construir algo, principalmente serviços governamentais, que funcionem através de SMS. Exceto para documentos importantes, como um passaporte, tudo seria feito por mensagem, consultar impostos, relatar um problema, puxar seu histórico. Cingapura foi pioneira nisto, e a Índia seguiu o exemplo. É um serviço chamado "e-govermment", que pode ser acessado pelo celular ou computador. Lembre-se de que só 5% da população possui um computador, mas todo mundo tem um celular para mandar mensagens e receber respostas imediatas. Se em Cingapura temos esse sistema, é possível aplicá-lo no Brasil.
Você diz que o celular é uma mídia de massas, mas tem propriedades particulares. O que significa ter uma mídia massificada, porém personalizada?
O conteúdo de uma mídia de massas alcança milhares de pessoas, mas não é personalizado. Por exemplo, enquanto você recebe milhares de notícias sobre esportes no Brasil, eu posso programar para receber notícias apenas sobre Fórmula 1. Eu não me interesso por futebol, mas quem é fã pode receber notícias sobre esse jogo e qualquer outro que lhe interesse. Isso é pessoal. Então nós podemos focar em como adequar esse conteúdo pessoal em uma mídia que tenha audiência das massas. No celular, nós podemos focar no que é relevante para nós. Seu melhor amigo escolherá um conteúdo diferente, assim como sua mãe, pai, filho, cada um selecionará as noticias dentro de um mundo de opções. Um exemplo: no Japão, foi introduzido um serviço de notícias que opera na tela do seu celular. Geralmente, a tela inicial do seu aparelho mostra que horas são. Melhor que o relógio, nós podemos ter a atualização de notícias de uma fonte como a CNN, através de um botão. Quando eles apresentaram esse sistema no Japão, foi um sucesso instantâneo. As pessoas pagavam US$ 2 por mês pelo acesso. Quando eu dizia isso nos jornais, eles diziam "Meu Deus". A reação era a mesma no rádio, na televisão e então eles passaram a reparar nessa nova moda e classificá-la como uma nova mídia de massas.
Você afirma que as empresas encontraram um novo caminho para ganhar dinheiro com celulares. Como isso é viabilizado?
Sim, os celulares são fábricas de dinheiro para a mídia. Eu lhe darei um exemplo que é até meio óbvio. O American Idol (formato original dos programas da linha do "Ídolos"). O que você pagar para votar em seu artista preferido pelo telefone é dividido entre a emissora, a companhia telefônica e os donos do American Idol. Nós podemos fazer isso pela Internet, podemos vender conteúdo e ganhar dinheiro através de mensagens premiadas. Nós podemos fazer isso na Billboard, no impresso, na televisão, cinema, em qualquer lugar. O celular é uma máquina mágica de fazer dinheiro. Nós podemos criar um conteúdo especial, no qual podemos vender pelo celular ou, paralelamente, adicionar novos elementos.