Daniela Moreira, de EXAME.com
São Paulo - Quando se mudou para Itacaré, na época um pequeno paraíso escondido no litoral baiano, Paulo Couto tinha o plano perfeito: montar um pequeno restaurante e viver na tranqüilidade para o resto da vida. Tudo saiu conforme o planejado: o restaurante ia de vento em popa, dando lucro suficiente para que ele mantivesse o padrão de vida que desejava, e a vida não podia ser mais tranqüila. Tranqüila até demais.
Com apenas 30 anos, Paulo viu o seu sonho se tornar pesadelo quando tudo que almejava se tornou realidade. “Passada a alta temporada, o ritmo de trabalho diminui consideravelmente, os amigos vão embora e você fica completamente à toa”, conta. Além do marasmo, a falta de infra-estrutura, serviços e produtos básicos que passa batida nas férias, cobra seu preço no dia-a-dia. “Qualquer coisa fácil de resolver na cidade grande, é uma dor de cabeça na pequena. Quer um exemplo banal? Um dia me bateu uma vontade incontrolável de comer no McDonald's. Tive que viajar seis horas até a cidade mais próxima para comer um lanche”.
Depois de dois anos de agonizante tranqüilidade, Paulo decidiu abandonar a empreitada. Mudou-se para Rezende, a duas horas de viagem tanto do Rio de Janeiro quanto de São Paulo, e abriu um negócio de internet. A mudança permitiu que o empresário unisse o melhor dos dois mundos: a tranqüilidade de uma cidade menor com uma rotina de trabalho independente da sazonalidade e a proximidade de grandes centros urbanos com toda a infra-estrutura, opções de entretenimento e acesso aos amigos que faltavam no seu pequeno paraíso praiano.
O caso de Paulo não é uma exceção. Muitos empreendedores abandonam seus empregos ou gastam todas as suas reservas para abrir o negócio dos seus sonhos e acabam se frustrando. Como no caso do empresário, muitas vezes o problema não está na má gestão do negócio ou na falta de lucro, e sim no descompasso entre expectativa e realidade. “O problema é quando a pessoa age por impulso e decide abrir o negócio primeiro para ver no que dá depois”, aponta Dalton Viesti, coordenador de graduação da Trevisan Escola de Negócios.
Imaginar-se à frente de uma pequena pousadinha no litoral ou comandando um charmoso café em um bairro descolado da cidade é tentadoramente fácil, mas os especialistas alertam: entre o sonho e a realidade, há um abismo de desafios a serem vencidos. “Unir o prazer ao trabalho é o sonho de todo mundo, por isso a primeira coisa que vem a cabeça quando se pensa em abrir um negócio é algo relacionado ao seu hobby”, aponta José Dornelas, especialista em empreendedorismo e autor de uma série de livros sobre o assunto.
Para o especialista, esta é uma armadinha perigosa. Não é só porque você gosta de cozinhar aos finais de semana que vai ter as habilidades necessárias para comandar um restaurante, e gostar de passar as férias na praia com a família não é garantia de sucesso no comando de uma pousada. E não se trata só de poder, às vezes é uma questão de querer. Nada garante que uma tarefa que te dá prazer nas horas vagas continuará sendo interessante quando você tiver que executá-la dia após dia, anos a fio. “Esse seria o melhor dos mundos, mas infelizmente não é fácil assim”, opina Dornelas.
Para evitar decepções, a melhor estratégia é estar preparado e ter uma visão bem realista dos desafios que lhe esperam. Confira a seguir algumas perguntas que você deve responder antes de mergulhar de cabeça no negócio dos seus sonhos e acabar preso em um pesadelo sem fim.
1. Você está pronto para fazer sacrifícios?
“O principal erro é confundir o empreendedorismo com uma opção mais light de vida”, destaca Dornelas. Tocar o próprio negócio implica, na maioria das vezes, em jornadas mais longas de trabalho e envolvimento total com o dia-a-dia da empresa. “O empresário tem que estar ciente de que dificilmente vai trabalhar só oito horas por dia”, aponta Jose Carmo Vieira de Oliveira, consultor do Sebrae-SP. Dependendo do negócio, finais de semanas e férias também podem entrar na conta, especialmente até a empresa decolar. O apoio da família também é indispensável. “As exigências do negócio acabam afetando a vida de todos na casa”, alerta Oliveira, acrescentando: “Por tudo isso, é preciso estar realmente motivado”.
2. Você tem dinheiro suficiente para fazer o negócio dar certo?
Essa é uma questão fundamental. Se você não tem dinheiro próprio, buscar um investidor ou a ajuda de parentes e amigos pode ser uma alternativa. As linhas de crédito também são uma opção, mas começar um negócio endividado é sempre mais difícil. “A maioria das empresas fecha por problemas de planejamento financeiro. Os juros altos do empréstimo prejudicam as contas da empresa nos primeiros meses de vida, que são os mais delicados”, alerta Viesti. Lembre-se de que você terá que ter ao menos as reservas necessárias para pagar suas despesas pessoais e familiares até que o negócio comece a dar lucro, o que pode levar um tempo. Se você está deixando o seu emprego para empreender, não esqueça de colocar na conta benefícios subsidiados pela empresa que você terá que pagar integralmente – como plano de saúde e alimentação -, além das férias e remuneradas e 13º salário, que não estarão mais garantidos. “Alguns negócios levam até dois anos para atingir o equilibro, você tem que estar pronto para não ter salário neste período”, observa Dornelas.
3. Você conhece realmente o negócio no qual vai entrar?
Se você está suficientemente motivado e tem dinheiro para abrir um negócio, o próximo passo é conhecer muito bem a área em que vai entrar. Mesmo que você tenha um interesse pessoal na área, certifique-se de que você se encaixaria bem na rotina do negócio. Você gosta de lidar com pessoas? Administrar um restaurante ou uma pousada, por exemplo, envolve lidar com funcionários, fornecedores e clientes o tempo todo. Você se sairia bem nestas situações? “É preciso fazer uma autoavaliação e estar muito consciente das suas habilidades e limitações”, recomenda Oliveira. Não basta deduzir como seria o seu dia-a-dia à frente do negócio, é fundamental ouvir as experiências de pessoas que já atuam na área há mais tempo. “Tente encontrar um coach, alguém mais experiente que possa te dar dicas de como conduzir melhor o negócio”, aconselha Viesti.
4. Você tem uma boa oportunidade de negócio?
Mesmo estando pronto para empreender e certo de que você tem vocação para o negócio, é preciso tomar cuidado para não ser a pessoa certa na hora e local errados. Certifique-se de que há espaço para mais um concorrente no mercado em que você quer entrar. Há clientes interessados no seu produto? Em quantidade suficiente? Onde eles estão? Qual é o seu diferencial? Todas essas perguntas devem ter respostas convincentes antes que você parta para a ação. Busque o máximo de informações possível sobre o mercado em que você vai atuar – sindicatos patronais, associações de classe e entidades de apoio ao empreendedor, como o Sebrae, podem ajudá-lo na tarefa. “Tem que ser muito bem planejado – não tenha pressa”, destaca Oliveira.
5. Você tem um plano de negócios?
Depois de refletir muito sobre os seus planos, é hora de colocá-los no papel. “Plano de negócios pode parecer um termo meio técnico, mas você pode fazer isso de maneira simples, estipulando quanto vai gastar, quanto pode faturar, seus pontos fortes e fracos, etc.”, detalha Viesti. O plano de negócios pode ajudá-lo a antever possíveis obstáculos e planejar-se para vencê-los. Se o seu negócio for sazonal, como uma pousada, você poderá calcular quanto terá que faturar nos meses de alta para compensar os meses de baixa, por exemplo. Um bom plano de negócios ajudará a estabelecer o capital necessário para começar o negócio, quanto você precisará de capital de giro e estoque, permitirá prever o fluxo de caixa da empresa a até estimar os lucros, minimizando as chances de surpresas desagradáveis.
Fonte: Exame PME
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