segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Marketing de Experiência e Neuromarketing

Postado por Rafael D'Andrea - 23/01/2012



Parte I: Primeiro mapeie o terreno, depois defina a estratégia.

Você já parou para pensar “onde” a experiência acontece? Quando as luzes se acendem no cinema ao final de uma sessão, escutamos diferentes comentários sobre o filme que acabamos de assistir. Sem grande esforço é possível perceber que embora tenham visto a mesma obra, cada um viu o filme a sua maneira, prestando atenção em coisas diferentes, processando segundo seus padrões de pensamento e finalmente, produzindo uma experiência própria. Onde aconteceu a experiência? Na mente do expectador e não na sala de cinema.



No mundo do varejo é a mesma coisa: a experiência de compra do shopper dentro de uma loja ou num website é sempre pessoal, interna e, portanto um pouco imprevisível. Para sorte dos nossos designers de experiências, investigando-se o shopper, é possível chegar a alguns agrupamentos de pessoas com “backgrounds” (tradução livre: histórias de vida) e modelos mentais que se refletem em comportamentos semelhantes, o que torna possível a segmentação dos clientes de uma loja ou rede. Além disto, possibilita o reenquadramento do diálogo e ambiente da loja para que façam sentido para cada um desses segmentos, aumentando a conversão.



Parte II: o sucesso é uma questão de “Rapport” com o shopper

O sucesso da comunicação das marcas de fabricantes de bens de consumo e dos varejistas com o shopper se baseia fundamentalmente em criar uma espécie de sintonia com os diferentes segmentos de shoppers que visitam um estabelecimento de varejo. Esta sintonia é chamada de “rapport”. Quando um vendedor de seguros conhece a estratégia de aposentadoria de um prospect ele tem muito mais chances de fechar a sua venda. Isso funciona com vendedores de seguros, carros, roupas e também funciona no auto-serviço.



Aqui em Nova York, por exemplo, aqueles que visitaram a Abercrombie & Fitch (A&F - loja de roupas) pela primeira vez se surpreenderam com seu ambiente no estilo “balada”, com luzes estroboscópicas, música alta e pessoas malhadas em fotos nas paredes e atrás dos balcões. Torsos masculinos depilados em fotos preto-e-branco nas paredes e sacolas certamente atraem a atenção de alguns, mas desagradam outros. Essa estratégia muito bem focalizada de comunicação é a base do sucesso da A&F que criou uma legião de fãs entre os adolescentes de todo o mundo.



No Brasil, a Chilli Beans é, para mim, o melhor exemplo de como uma loja pode entrar em sintonia com seu público em vários níveis, criando uma experiência única. Mesmo num quiosque dessa marca de óculos, relógios e acessórios, é possível reconhecer a assinatura marcante dos seus criadores e o seu foco no público jovem. Eles tiveram êxito em definir um alvo claro e conectar-se com ele no ponto de venda em todos os níveis neurológicos da experiência. Vou explicar esse conceito: nossas experiências são processadas em nossa mente em 5 níveis ligados à própria forma como nosso cérebro foi “desenhado” para atuar:



a) Ambiente: é o mais instintivo dos níveis, gostamos ou não de um ambiente sem nem mesmo sabermos por quê.



b) Comportamento: envolve algumas emoções associadas ao efeito “amor à primeira vista”. Simplesmente nos sentimos bem ou mal dependendo de como somos recebidos. É instantâneo: um garçom desavisado pode arruinar nossa experiência com um simples comentário, por exemplo.



c) Identidade: a identidade está ligada ao sistema imunológico. Assim, nos sentimos mais confortáveis entre semelhantes. Daí o sucesso da loja de bonecas e roupas de infantis American Girl. Nela as crianças podem comprar bonecas que se parecem com elas mesmas e depois vestirem-se com roupas iguais as da boneca que a mimetiza. É genial e vai direto ao centro da identidade das crianças e das mães. Todos são pegos desguardados pelas lindas bonequinhas.



d) Crenças e valores: eles refletem a forma como fomos criados, educados, aquilo em que acreditamos. Esse tipo de pensamento é processado pelo cérebro no córtex, a região mais nova na evolução humana. Muitas pessoas decidem não comprar produtos testados em animais por uma questão de valores. As crenças mostram como as pessoas julgam os acontecimentos. Por exemplo, a discussão sobre privacidade nas mídias sociais envolve uma discussão de valores baseados em crenças pessoais. As pessoas que gostam de Macs tem a crença de que eles são melhores do que os PCs, e assim por diante.



e) Além da identidade: esse é um tipo de experiência que pode ser chamada de “espiritual” porque envolve a forma como nos vemos e vemos os outros inseridos no mundo. As grandes aspirações humanas e os sentimentos mais nobres como a compaixão acontecem nesse nível. Quando uma marca está envolvida sinceramente em ajudar a comunidade, percebemos isso e nos conectamos com ela. Uma vez ouvi do vice-presidente de design da P&G – Phil Duncan – o conceito de “brand karma”. Ele explicou que quando fazemos o bem ganhamos dinheiro. Acertou em cheio no último nível da experiência.



Como um varejista pode criar uma estratégia de sucesso usando os níveis neurológicos da experiência no processo de compra?



Parte III: Sete passos para criar uma experiência de compras memorável.

Todo varejista de produtos de consumo quer vender mais. Isso somente é possível com uma de duas estratégias: aumentar o tráfego de pessoas na loja ou aumentar a conversão de vendas dentro da loja, fazendo com que os shoppers comprem mais.

Listei sete passos que qualquer varejista pode usar para guiar sua estratégia de neuromarketing de experiência para aumentar a conversão de shoppers em suas lojas:



1) Conheça seus shoppers. Invista em pesquisa, análise de dados, observe-o no ato, interaja sem medo, esteja onde eles estão (na loja, no facebook, no estacionamento, etc.) e principalmente escute-os. Sem conhecer o funcionamento da mente dos shoppers é impossível conectar-se com eles.



2) Crie uma segmentação. Ela pode ser baseada em perfil demográfico, comportamento de compra e/ou motivações de compra. Isso vai garantir mais eficiência na comunicação com os shoppers mais tarde.



3) Escolha o(s) segmento(s) predominante(s). Idealmente é aquele no qual sua empresa já tem mais afinidade e por tanto tem mais chances de sucesso.



4) Avalie se os valores da empresa coincidem com os valores desse grupo. Se isso não acontecer, o resultado será uma fraude rapidamente percebida pelo público-alvo.



5) Conecte-se. Uma experiência de compra genuína será criada por meio da transformação da estratégia em prática. Assim, sua comunicação, sortimento, atendimento e design com o grupo escolhido de shoppers serão percebidos na interação deles com o ponto de venda. (Os níveis são: ambiente/comportamento/identidade/crenças e valores/espiritual).



6) Estabeleça canais de comunicação de mão-dupla com seu público na loja, na web e na comunidade. Participar da vida social dos shoppers aumenta o senso de identidade com a loja. A Chilli Beans, por exemplo, ao vender ingressos para concertos de música jovem estabelece um vínculo com seu público por meio do gosto musical. A marca de whisky Buchanna’s o faz patrocinando eventos de jazz, por exemplo.



7) Crie uma assinatura que envolva os cinco sentidos dos shoppers. Isso deixa a experiência mais completa e mais memorável ainda. Se bem trabalhados, os sentidos irão funcionar a favor de sua marca. Não é a toa que os jeans da A&F têm um cheiro característico que demonstram sua autenticidade. Eu nunca vi um chip Intel, mas reconheço o seu selo e a musiquinha quando escuto. Por quê? Porque os sentidos nos ajudam a reconhecer as marcas instintivamente.



Parte IV: Usando os cinco sentidos para criar uma experiência memorável.

Confunde-se muito o marketing de experiência com o uso dos sentidos, ou melhor, das sensações para estimular os shoppers durante a compra. Vamos esclarecer uma coisa: os sentidos são as portas, não a experiência.



Escutamos uma música romântica hoje e somos elevados às alturas. Quando o romance acaba a mesma música é fonte de dor. A experiência acontece na mente. É como nos relacionamos no nível do instinto, das emoções e do pensamento com tudo o que os nossos sentidos capturam da natureza. Ou seja, tudo o que vemos, ouvimos, sentimos, degustamos e cheiramos. Por exemplo, o cheiro do McDonald’s é inconfundível. Certamente é uma assinatura sensorial da marca.



Uma vez tive uma experiência desagradável. O prédio em que trabalhava teve um problema e o alarme de incêndio disparou. Fiquei impressionado porque ninguém desceu, mesmo com o perigo iminente. Algum tempo depois, no mesmo edifício, onde também funcionava uma parte da fábrica, o alarme tocou novamente. Dessa vez havia cheiro de plástico queimado no ar. Todos desceram imediatamente! Por que isso aconteceu? Porque ao envolver mais de um sentido, a mensagem ganha mais credibilidade.



Pense que você está comprando queijos no supermercado. Embora a aparência esteja boa, se o cheiro do queijo é rançoso irá afastá-lo da compra. Nós confiamos muito em nossos sentidos. É possível extrair vantagem desse aspecto neurológico a favor de uma marca.



Para utilizar os sentidos a seu favor é preciso “descontruir” a marca em diversos atributos, elegendo alguns sensoriais que distingam a sua marca e fiquem na lembrança dos shoppers. O formato da garrafa de Coca-Cola é um excelente exemplo disso. É uma assinatura visual e táctil da marca que pode ser reconhecida mesmo sem sua logomarca em qualquer parte do mundo. Suas músicas também são percebidas e reconhecidas instantaneamente quando escutadas.



Da mesma forma, a Victoria Secret´s, rede de lojas de lingerie americana, possui uma sacola característica rosa de listras negras (apenas uma das assinaturas visuais da marca cuidadosamente desenhada). Além disso, a fragrância característica das lojas é inesquecível pelas suas shoppers.



Em outro segmento, um banco na Colômbia (Grupo Helm) usa uma cor específica - como a do Itaú – mas vai além. Eles também têm uma fragrância própria em suas instalações, sons diferentes em cada parte das agências e até oferecem docinhos com marca e sabor únicos para envolver todos os sentidos dos seus clientes na experiência com sua rede. Os caixas eletrônicos dessa instituição são os únicos onde se pode sacar dinheiro sentado em apoios acolchoados, para deleite do tato e da coluna.



Todos os sentidos podem levar a emoções. A música, por exemplo, tem um poder muito forte de provocar emocionalmente os indivíduos. Mas são a dupla olfato e paladar que estão diretamente ligados ao afeto. Isso acontece porque desde quando somos bebê, aprendemos a gostar de quem nos alimenta e estabelecer um vínculo afetivo com eles, a começar por nossas mães, é claro. Comida é afeto. Isso é tão verdadeiro que muita gente come para sentir-se mais feliz ou quando está deprimido.



Quando queremos comemorar algo o que fazemos? Saímos para jantar! É simples assim. Pensando nisso, algumas lojas de luxo oferecem pequenos mimos para seus clientes. Chocolates, trufas, biscoitos, sucos e até champanhe são oferecidos aos clientes, criando um vínculo afetivo com a marca. Alguns supermercados sabem explorar muito bem esse aspecto usando as degustações de forma inteligente para criar um ambiente ainda mais envolvente para seus shoppers.



Parte V: Construindo um contexto que faz sentido emocional para os shoppers

Enquanto a experiência cria a conexão com o shopper em diversos níveis e os sentidos o envolvem, é por meio da comunicação que podemos criar um contexto relevante para o shopper converter-se em um comprador. Mas qual é o significado de relevância?



A relevância da comunicação e da oferta de uma marca acontece a partir da compreensão da mente do shopper. Ou seja, como ele pensa, quais são suas estratégias de decisão e consequentemente, como age. Essa é a diferença entre um lançamento de produto e o que chamamos de “arremesso de produto”. A mesma comparação pode ser feita entre um tabloide de ofertas genérico – cujas promoções são em sua maioria itens que o shopper não compra - e uma mala direta com ofertas personalizadas. Isso sim é relevância. A Macy’s, rede americana, tem mais vários tipos de catálogo de ofertas, um para cada segmento, configurado diferentemente para cada um deles.



Somente com um contexto relevante é possível usar a emoção para mover o shopper e influenciá-lo a favor de uma marca ou varejista. Já sabemos que os cinco sentidos tem um papel importante como estímulo emocional, que o contexto é que cria o clima, agora falta apenas o fechamento. Nesse ponto é preciso usar a emoção para reduzir o arrependimento potencial com a compra do produto. Eu sempre cito o exemplo dos garçons argentinos. Eles são treinados para retorquir com uma expressão de aprovação como: “Excelente, señor!” quando fazemos um pedido, qualquer que seja. Isso nos encoraja por que acreditamos que estamos ordenando o melhor prato da casa, a sua especialidade.



No autosserviço é possível reduzir o arrependimento potencial com a compra fazendo o shopper sentir-se menos culpado por gastar seu dinheiro com produtos de consumo. Quando um varejista sinaliza que um produto é o mais vendido, um “best seller”, como a TESCO inglesa em seus pepinos espanhóis, isso reduz o risco de uma decisão errada por parte do cliente. Doações imediatas para causas nobres e selos de qualidade, por exemplo, têm efeito semelhante nos shoppers – reduzem o risco.



Resumindo, para usar a emoção a seu favor é preciso de uma chamada (call to action) poderosa, direta e principalmente, que seja relevante no contexto de vida do shopper. São mais de vinte mil opções no ponto de venda e apenas 30 minutos em média para converter mais um shopper. Tenho certeza que vale a pena. Afinal, considerando sua fidelidade a marca de varejo, quanto vale um shopper a mais para sua loja, na perspectiva de uma vida toda? Qual é o ROI (retorno sobre investimento) que justifica investir em shopper marketing? Pense nisso. Voltaremos a esse assunto (valor de um shopper para o varejista ao longo de uma vida – ou customer life time value) em breve.



* Rafael D’Andrea é fundador da ToolBoxTM e diretor da Agência Shopper. Atua como professor de marketing do Insper desde 2009 e é coordenador e co-autor dos livros Shopper Marketing (ed. Atlas 2011) e Trade Marketing (Ed. Atlas 2010). Compartilhe suas opiniões conosco pelo twitter (@toolboxtm), blog ou email, contato@toolboxtm.com.br, www.toolboxtm.com.br e www.agenciashopper.com.br

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