A onda dos Food Trucks, os caminhões estilizados transformados em restaurantes itinerantes, chegou ao Brasil com força no segundo semestre de 2014. A moda foi estimulada especialmente por uma lei da prefeitura de São Paulo que entrou em vigor em maio deste ano regulamentando a venda de alimentos em barracas, carrocinhas e veículos automotores. Na capital, já são pelo menos 300 estabelecimentos deste tipo.
As cozinhas sobre rodas se assemelham à tradicional comida de rua apenas em sua localização. Já o cardápio reúne ingredientes premium e pratos reconhecidos da gastronomia de diversos países. As refeições como o tradicional ceviche peruano, hambúrgueres gourmet, paellas e sanduíches espanhóis com ramón (presunto), são algumas das opções preparadas e servidas na frente dos consumidores. O requinte se mistura com preços atrativos: o tíquete médio fica em R$ 20,00 e as porções são obrigatoriamente generosas.
A descontração do ambiente pode passar a falsa ideia de que este seja um nicho ocupado por amadores, mas, por trás dos fogões, estão chefs de cozinha renomados com curriculum internacional, importadoras e até mesmo restaurantes que possuem unidades em lojas fixas e já consolidadas no mercado. “Antes do food truck, as pessoas tinham preconceito com a comida de rua. O novo modelo contraria o estereótipo pela qualidade, higiene e uma apresentação que desperta a curiosidade. Não são aventureiros, são profissionais reconhecidos por traz destes negócios, o que faz toda a diferença”, diz Carla Somose, Sócia-Fundadora do Guia Food Truck nas Ruas, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Food Truck na origem
O que é novidade por aqui começou nos Estados Unidos, por volta de 1870, com caminhões do mesmo tipo dos usados pelos correios, que vendiam tortas e sanduíches para os funcionários das fábricas. Já no século XX, os mexicanos que moravam no país começaram a usar os veículos para vender tacos. A imagem destes estabelecimentos até o início da década de 2000, no entanto, era relacionada a alimentos improvisados e pouco elaborados, sem nenhum tipo de glamour.
Com a crise financeira de 2008, nasceu o novo momento da comida de rua na América do Norte. Muitos chefs que tocavam seus restaurantes precisaram fechar as portas devido ao alto custo das operações. O caminhão passou a ser visto como uma alternativa bem mais barata do que as estruturas fixas tradicionais que demandam aluguéis, decoração, mobiliário, impostos e equipes bem maiores. O custo-benefício aparece na projeção que este mercado apresenta nos EUA, de acordo com o site especializado segmento, Mobile Cuisine. Os food trucks registraram um crescimento de 8,4% entre 2007 e 2012 no país, o que representa mais de três milhões de unidades espalhadas e que devem movimentar US$ 2,7 bilhões em 2017.
Esta economia também foi um dos fatores que atraiu os brasileiros para o modelo. Para equipar o espaço médio de 10 metros quadrados do interior de um caminhão, estilizar e tirar os devidos documentos, os valores vão de R$ 50 mil à R$ 300 mil, de acordo com o carro escolhido, valor bem abaixo do cobrado por um ponto comercial em um local nobre em grandes centros. Em São Paulo ou no Rio de Janeiro, o custo com o local pode ultrapassar a casa do R$ 1 milhão, sem levar em consideração reformas, equipamentos e equipe.
Internet, o ponto de encontro dos trucks
Os food trucks são, em sua essência, móveis. Essa natureza traz prós e contras para as empresas. Entre os benefícios, está a facilidade de expor a sua marca e culinária para diversos públicos, que talvez não tomariam conhecimento destes restaurantes se ficassem limitados a um mesmo ponto. As rodas permitem esta mobilidade que multiplica a propaganda boca a boca em diferentes áreas da cidade em um curto período. Outro ponto positivo é o fato de os estabelecimentos se tornarem novidade aonde chegam, já que a estadia em cada localidade é por tempo determinado, o que gera senso de urgência.
Ao mesmo tempo, a mudança frequente de pontos pode dificultar o retorno do público a um estabelecimento específico. Para solucionar este problema, as publicitárias Carla Somose e Kelly Ferreira, sócias da agência Recreative, resolveram agregar todos os caminhões, vans e kombis dedicados à gastronomia no Guia Food Truck nas Ruas. O projeto levou um mês da concepção até entrar no ar na internet. Os estabelecimentos pagam mensalidades de R$ 80,00 para terem perfis atualizados semanalmente com cardápio e localização.
A ideia logo se ramificou e o guia passou a organizar feiras gastronômicas em diferentes cidades. “As pessoas começaram a nos perguntar se éramos nós que organizávamos algumas feiras que já aconteciam. Percebemos a demanda e aderimos aos eventos. Indicamos clientes cadastrados para festas coorporativas e também organizamos feiras próprias com vários food trucks ao mesmo tempo. Nestes casos oferecemos divulgação e estrutura”, diz Carla Somose.
O carro é o cartão de visitasPara impactar o público e atrair para a experimentação ainda no primeiro contato, os empreendedores adotam identidades visuais chamativas, inusitadas e alinhadas com os produtos vendidos. A ideia é que o carro, principal ativo da empresa, já sirva de divulgação por si só. Este raciocínio fez com que os empresários Mario Reuter, sócio da importadora de cervejas Uniland, procurasse durante dois anos o modelo mais adequado para a sua cervejaria motorizada.
O caminhão selecionado foi um Citröen HY Van, projetado após a Segunda Guerra Mundial e importado da França por R$ 153 mil. “Se fosse um carro Mercedes ou um Ivecco do tipo que as pessoas já estão acostumadas a ver no trânsito de São Paulo não chamaria atenção. O nosso caminhão tem uma cara simpática, lembra um Buldog, as pessoas olham, esboçam um sorriso e se aproximam”, conta Mario Reuter, Sócio da Uniland, em entrevista ao Mundo do Marketing,
O layout do caminhão, bem como dos outros três carros menores que a importadora possui, são os seus maiores cartazes. A empresa usa os veículos para promover sua loja física, que fica no bairro do Itaim, em São Paulo, participa de feiras e eventos privados e também realiza ativações de Marketing junto aos bares que firmam contratos de fornecimento de bebidas. “É comum deixar um dos carros adesivados com as marcas das cervejas na frente dos bares parceiros. Temos casos de casamentos que também nos contratam para servir na festa. Fechando bastante eventos este ano e queremos mais um caminhão igual ao Citröen para o ano que vem. Isso ajuda a construir a identidade”, conta o Sócio da Uniland.
Atração das marcasAs marcas de produtos alimentícios também aproveitaram a moda para se promover. Antes mesmo da liberação dos food trucks, o cream cheese Philadelphia elaborou, no primeiro semestre de 2013, a promoção “Casa Cozinhaterapia”, que levava um ônibus equipado com uma cozinha gourmet para pontos como o Shopping DownTown, no Rio de Janeiro, e a Praça José Lannes, em São Paulo. A proposta da marca era convidar os visitantes a prepararem pratos em um ambiente diferente para sair da rotina. No espaço, chefs ensinavam aos consumidores alguns segredos culinários e receitas utilizando o ingrediente.
Mais recentemente, a marca Ceratti firmou uma parceria com o restaurante Paella’s Peppe para incluir no cardápio do food truck os sanduíches de presunto espanhol, o ramón, que é importado pela marca. No primeiro dia de funcionamento do estabelecimento, foram servidos 1,2 mil clientes. A empresa especializada em embutidos pretende manter a parceria a longo prazo e não tem intenção de assumir um caminhão por conta própria. “Neste segmento, o importante para o cliente não é a marca encabeçar o food truck e sim ele ser representado por um restaurante que já gere identificação com este público. A marca entra para reforçar este relacionamento”, diz Fábio Poveda, Gerente de Importados da Ceratti, em entrevista ao Mundo do Marketing.
A companhia já visa outras parcerias com diferentes estabelecimentos. O próximo passo é se associar a um restaurante especializado no sanduíche de mortadela que ficou famoso no mercadão popular da capital paulista. “Em dois meses devemos inaugurar um food truck especializado no sanduíche de mortadela com outro parceiro, mas isso logo deve abrir precedentes para os concorrentes seguirem o mesmo caminho. O mercado ainda está em formação no Brasil, mas veio para ficar, sem dúvidas”, complementa o Gerente de Importados da Ceratti.