De um lado, a visão de enxergar os pontos fortes e fracos dos adversários; do outro, a criação de um conteúdo que estabeleça uma conversa com o público
A comparação do marketing corporativo com o praticado por militares, no passado, deve ser feita guardando sempre as devidas diferenças. Se na guerra, o objetivo era liquidar o inimigo para vencer, no marketing de guerrilha, o adversário não necessariamente deve desaparecer para haver sucesso. Essa é a afirmação do professor de Estratégia e coordenador do curso de pós-graduação em Excelência Gerencial da Faap (Fundação Armando Alvares Penteado), Carlos Roberto Lago Parlatore.
“A criatividade é e sempre será uma peça-chave para o sucesso. É claro que, a criatividade aliada à disponibilidade financeira é o ideal. Por outro lado, somente a disponibilidade financeira sem criatividade é uma forma mais rápida de gastar dinheiro sem agregar resultado. As pequenas e médias empresas devem usar o Marketing de Guerrilha no sentido de entrar em nichos onde podem ser melhores que as grandes, pelo fato de serem mais flexíveis e de focarem melhor em um determinado segmento.”
O grande iniciador do conceito de Marketing de Guerrilha, na análise de Parlatore, foi o guerreiro chinês Sun Tzu, com seu livro milenar denominado ‘A Arte da Guerra’, onde são postados conceitos empregados há mais de 2.500 anos e que ainda são utilizados. Neste livro, são mencionadas as alternativas que os exércitos menores deveriam ter para combater exércitos mais numerosos.
“Por isso, faço menção a Sun Tzu que, em minha opinião, foi onde Jay Conrad Levinson também baseou-se para definir o termo Marketing de Guerrilha em seu livro. O menor busca seu lado forte e usa as ferramentas e estratégias que melhor conhece para derrotar os mais poderosos. Veja, por exemplo, o que ocorreu na guerra do Vietnã, na década de 1960, onde a guerilha local derrotou um exército muito mais poderoso do que era o dos Estados Unidos, usando táticas mais conhecidas. Essa e outras expressões atuais foram baseadas nesse livro milenar”, afirma.
No caso da internet, pela sua imediata ocupação de espaço, o Marketing de Guerrilha torna-se muito eficaz, pois consegue mostrar mais rapidamente as qualidades de um produto, comparativamente a seus concorrentes. E não necessariamente precisa de elevados recursos financeiros para desenvolver ações que despertem o interesse do consumidor. “O importante, como dizia Sun Tsu, é conhecer suas forças e qualidades e as fraquezas e defeitos dos concorrentes. Com isso, as chances de vitória são totais.”
Cases de sucesso e insucesso
Na análise de Parlatore, um case onde o Marketing de Guerrilha é muito explorado está relacionado aos anúncios e propagandas da Hyundai. Eles não somente mostram as qualidades de seus produtos, mas os comparam com os produtos concorrentes, maximizando suas deficiências, como preço maior, por exemplo.
“Outro caso muito explorado nos Estados Unidos são as batalhas travadas entre Coca-Cola e Pepsi, onde frequentemente se vê uma empresa mostrando as fraquezas da outra e valorizando seus próprios produtos”, destaca.
Mais um exemplo de sucesso foi a campanha da Nissan, na Alemanha, onde a marca colocou adesivos no vidro dianteiro dos modelos Porsche, um dos concorrentes da empresa japonesa. A ideia atingiu seu objetivo: o modelo da Nissan parecia sempre estar na frente do Porsche. Analistas de marketing comentam que, em duas semanas de campanha, a empresa do Japão obteve aumento de 23% dos interessados em fazer test drive em seus carros.
Para Parlatore, casos que não tiveram êxito apresentaram exageros em sua produção ou não conseguiram focar no ponto principal de uma disputa. Como exemplo, ele cita a campanha da marca Assolan, que tentou derrubar as vendas da também empresa brasileira Bombril, principalmente sobre o produto da lã de aço utilizada para limpeza. “A Assolan iniciou um marketing agressivo contra a Bombril, mas não conseguiu derrubar a concorrente, que soube valorizar seus pontos mais representativos, como qualidade e o fato de ser muito mais conhecida pelo consumidor”, avalia.
Outro case com retorno negativo envolveu, no final do ano passado, a empresa Procter & Gamble, no Rio de Janeiro. Foram espalhadas arcas de madeira em várias regiões do Rio, o que seria uma estratégia para determinada campanha. Porém, naquele momento, a capital fluminense passava por momentos de guerra entre policiais e traficantes. A população carioca ficou desconfiada das caixas e até equipes antibombas foram acionadas, o que provocou uma situação desagradável para a P&G.
Atuação em guerrilha
A Agência Espalhe, fundada em 2003, usa a criatividade de guerrilha para transformar os seus clientes em assunto. Neste cenário, o sócio-diretor da agência, Gustavo Fortes explica que é fundamental a comunicação em uma linguagem natural, aberta, honesta, engraçada e, muitas vezes, chocante.
“No Marketing de Guerilha, o objetivo é potencializar o investimento do cliente. Não quer dizer menos custo, mas sim aproveitar ao máximo o investimento dele para gerar um maior de resultado. A guerrilha cria um conteúdo, uma história, que tem como foco envolver as pessoas e engajá-las, estabelecendo uma conversa. Para aumentar a assertividade, é importante planejamento. Na Espalhe, gastamos muitas horas no planejamento estratégico de nossas ações, o que reduz a margem de risco”, afirma.
Um dos mais recentes cases desenvolvidos pela Espalhe foi feito para a Trident em comemoração ao Dia dos Namorados. Desta vez, foi São Paulo que recebeu a Cabine Trident Powered by YouTube, como ponto de encontro para solteiros em busca da cara-metade ou casais que queiram mostrar publicamente seu amor.
Na sexta-feira (dia 10/06), eles puderam gravar declarações apaixonadas dentro da cabine, em vídeos de 30 segundos para serem compartilhados no canal da Trident no YouTube. A primeira ação da Cabine Trident foi realizada, no Rio de Janeiro, durante o Carnaval deste ano. A iniciativa gerou um aumento de 109% no número de assinantes do canal Trident no YouTube e o crescimento de 8% dos fãs da marca no Facebook.
A ideia é fazer barulho!
No conhecido livro ‘Marketing de Guerra’, os autores Al Ries e Jack Trout enfocam conceitos modernos e realistas, muitas vezes fundamentais, para enfrentar e vencer as guerras registradas no mundo dos negócios. Ambos os escritores afirmam que o melhor livro de marketing foi escrito, em 1882, pelo general prussiano aposentado, Karl von Clausewitz, intitulado ‘On War, delineando os princípios estratégicos que amparam todas as guerras em que houve êxito. “Para ter sucesso hoje em dia, uma empresa deve procurar os pontos fortes e fracos dos concorrentes e lançar contra eles os seus ataques de marketing”, afirmam Ries e Trout.
O Marketing de Guerrilha, há mais de duas décadas, era utilizado para se discutir posicionamento de marca, segundo analisa Paulo Sérgio Quartiermeister, diretor do Centro de Inovação e Criatividade da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing). Hoje, este conceito é voltado à comunicação. A ideia é fazer barulho, gastar pouco e atrair a atenção de muita gente. Para despertar o consumidor, empresas optam, em muitas situações por personagens diferentes e mensagens inusitadas. Tudo para provocar uma grande repercussão positiva entre o público-alvo, sem obrigatoriamente dispor de elevados valores financeiros.
“Mas, não são apenas as pequenas empresas que podem utilizar o Marketing de Guerrilha. Claro que elas são as maiores interessadas por ter uma verba menor, mas as grandes podem e devem se utilizar deste tipo de marketing. A hora em que se consegue criar algo bem planejado, você provoca um barulho que precisaria de muito mais recursos, nos meios de comunicação tradicionais, para ter o mesmo efeito.”
Para Paulo Sérgio, é importante criar estratégias para tirar o consumidor da rotina e surpreendê-lo com algo diferente. “Quem manda no Marketing de Guerrilha é a criatividade. É óbvio que precisa de todo um processo, como um bom planejamento para executar, mas não adianta nada se não houver atividades criativas. O Marketing de Guerrilha é bom senso”, afirma. A estratégia, de acordo com ele, é combater o concorrente, identificando seus campos de atuação e tentando fazê-lo perder espaço.
No entanto, para o diretor do Centro de Inovação e Criatividade da ESPM, a concorrência também é, em muitos casos, imprescindível. “A concorrência é algo saudável. É o melhor antídoto para não ficar parado. Se tem concorrência, dá dinamismo para o mercado. É claro que o dono da Good Year, fabricante de pneus, gostaria de estar sozinho na fabricação de pneus, mas, com raríssimas exceções, isso é utopia”, complementa.
Fonte: Portal HSM 15/06/2011