quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Marketing de Massa X Marketing de Relevância

Por Mauro Negrão*




Em Julho de 2004 a revista Business Week publicou uma reportagem de capa anunciando a decadência do marketing de massa frente às novas tecnologias, à proliferação de produtos e também uma mídia cada vez mais fragmentada – ‘The Vanishing Mass Market’. No artigo seguem vários exemplos sobre como o marketing vem se tornando cada vez mais individualizado para gerar interesse em grupos de pessoas cada vez mais dificeis de se atingir com a midia de massa.



De fato, o que vimos nos ultimos cinco anos foi uma multiplicação de canais como Facebook, Twitter e Blogs que permitem qualquer um falar sobre assuntos relevantes para grupos de pessoas com interesses em comum. Nesse período testemunhamos também um controle cada vez maior nas mãos do consumidor digital, ou melhor na ponta dos dedos com seus iPhones e BlackBerry. O comércio online se solidificou e já oferece maior segurança para um público cada vez maior.



O sucesso de Amazon com suas recomendações inteligentes também inovou o comécio eletrônico quando uma equipe de estatísticos aplicava data mining na imensa base de dados de buscas e compras para otimizar ofertas relevantes conforme os clicks de cada visitante apresentando um pop-up de recomendação de produtos que dizia algo como ‘pessoas que se interessaram por esses produtos que voce selecionou tambem compraram estes abaixo’.



Ao mesmo tempo, o sucesso de Google abriu um novo canal de marketing interativo e relevante bem mais poderoso que a mídia unilateral e estática como anúncios em revistas e jornais. Hoje em dia é muito comum buscar por informações antes de se decidir pela compra de qualquer produto ou serviço, desde um sabão em pó, um restaurante, um livro e até um carro (SEO).



Sem falar na explosão de Apps que surgiram nos ultimos dois anos para facilitar o dia a dia de um consumidor cada vez mais conectado através de sua telinha personalizada, bem longe da tela da televisão aberta, fazendo download seletivamente daquilo que lhe interessa e muitas vezes avesso ao papel apesar da proliferação de revistas cada vez mais específicas nas bancas com anunciantes em busca de targeted marketing e ROI. E pensar que tudo isso aconteceu após ano de 2004. As previsões estavam certas.



Na mesma reportagem, o principal executivo de marketing da gigante Procter&Gamble, James R. Stengel, fala sobre relevância individual sentado no topo da catedral do marketing de massa. Ele chega a afirmar que a P&G não fabrica uma marca de massa sequer, pois todas são segmentadas e dirigidas a um publico específico – “Você encontra as pessoas.Você põem foco total nelas. Você se torna relevantes para elas”. Na verdade a P&G chega a manter cerca de 1.300 patentes protegidas em todos os países onde atua.



Por outro lado, quem pensa que marketing de relevância é um assunto restrito a grandes empresas como P&G, que investem fortunas em pesquisas de mercado e customer intelligence, se surpreenderá como certas práticas bem simples funcionam muito bem em qualquer lugar, em qualquer época, quando se conhece o cliente e seus habitos de consumo para oferecer-lhe algo que seja mais relevante e, portanto, mais interessante e que se transforme numa compra.



Podemos até dizer que o marketing de relevância existe desde a época do famoso ‘põem na conta’ quando, como diz uma lenda do marketing, o sabido português anotava todas as compras de seus fregueses do armazém no famoso ‘caderno’, criando junto com sua memória, uma inteligência de informações sobre os hábitos de compras de cada família e desse modo ele sabia exatamente o que oferecer à cada um de seus clientes quando estes chegavam à loja, além de outras informações como a data de aniversário, nascimento e falecimento de parentes, novos moradores, etc. Ou seja, informações pessoais que serviam para melhorar o relacionamento com a freguesia.



Encontramos também o marketing de relevância num templo da gastronomia brasileira que por sua vez vem conquistando mais espaço nos EUA com cada dia mais adeptos pela qualidade, abundância e no jeito customizado de servir comida onde o cliente paga um preço fixo e escolhe o que quer, e quanto quer comer de um variado buffet de carnes, saladas e até sushi bar - a nossa tradicional churrascaria rodízio ou Brazilian Barbecue como é chamado pelos americanos.



Cadeias como ‘Fogo de Chão’ na região oeste, ‘Porcão’ na costa leste e ‘Churrascaria Plataforma’ em NY que vem promovendo intensamente o nosso tradicional churrasco rodízio que por sua vez caiu muito bem no gosto do publico americano. Todos que experimentam se rendem ao modo brasileiro de fazer uma picanha, coração de galinha, fraldinha e outros cortes exóticos usando somente sal grosso e alho. Nada de ketchup, molhos agri-doces e pimenta que alteram o sabor da carne.



Os clientes nessas churrascarias se divertem com o nosso ‘controle remoto’ verde-vermelho e saem todos rindo saciados e satisfeitos pagando em média cerca de US$ 50 por pessoa só pelo rodízio sem bebidas, gorjetas e taxas. Vivendo há alguns anos em NY tenho a necessidade de matar a saudade de nossa tradicional cozinha brasileira e, portanto, costumo frequentar restaurantes brasileiros na região, as vezes trazendo meus clientes americanos para conhecerem um pouco de nossa cultura.



Tem um restaurante brasileiro que é meu preferido pelo fácil acesso, mais também pela relação custo e benefício, pois a comida é boa e o preço é justo.Todos os garçons são brasileiros e muito comunicativos com apelidos bem peculiares que parece mais um time de futebol: Sorriso, Junior, Zezinho, Marcos, Pãozinho, Eder, Ezio, Pedrão, Paquito, e o técnico PG, e até um bartender de Mondovia, uma republica nos Balcãs, ex-USSR, Igor, que já preparou mais de 10 mil caipirinhas em sua vida profissional, uma ótima curva de aprendizagem sem dúvida.



Neste lugar conheci um carioca, o Zeca, muito simpático que trabalha como host na entrada do restaurante. Ele desenvolveu uma técnica bem interessante de ‘pescar’ clientes na porta e explicar em inglês o que é um churrasco rodízio, uma feijoada completa e um até stogonoff de origem húngara, mas com tempero brasileiro, vatapá, coxinha de frango, entre outros quitutes brasileiros que soam muito exóticos pela primeira vez para um estrangeiro.



Eu ficava observando seu trabalho sentado a uma mesa junto à janela. Em média, o ‘experto’ Zeca conseguia vender o peixe, ou melhor o churrasco rodizio, com sucesso uma a cada três abordagens feitas à clientes que paravam para ler o cardápio num pedestal à entrada. Ele deixava o prospect se aproximar para ler o cardápio e depois de um tempo abordava o interessado perguntando se conhecia a cozinha brasileira, principalmente o churrasco rodízio. Calculei por alto o response rate em torno de 25-30%.



O Zeca conseguia trazer para dentro do restaurante todo tipo de turista com seu jeito carioca de gesticular, famílias americanas e européias com crianças e adolescentes, casais americanos na melhor idade voltando de um show procurando algo exótico, grupo de amigos e amigas celebrando um aniversário, entre outros tipos de clientes e também muito turistas pela localização junto à Broadway e Times Square.



O Zeca ia sempre direto ao ponto. Para todo tipo de público que passava na calçada do restaurante ele tinha um discurso preparado enfatizando os benefícios mais relevantes para cada pessoa que parava espontaneamente em frente ao cardápio pendurado na porta. Se chegava um casal mais senior e bem vestido saindo de um show, ele falava sobre degustação de tipos de carnes com um corte diferente do cut americano.



Para uma familia de turistas, o argumento era value-for-money explicando o benefício do preço fixo por pessoa para comer à vontade, além de oferecer desconto para crianças. Se fossem jovens turistas europeus, parrudos e famintos que chegavam à porta após caminharem durante horas seguidas por Manhattan, ele falava em 'all you can eat' dramatizando com as mãos a quantidade de carne de boa qualidade que não pára chegar à mesa em espetos fumegantes enquanto o ‘controle remoto’ estivesse no verde.



Ele me contou que no início, sem muita experiência e com pouco conhecimento sobre os tipos diferentes de clientes, simplesmente tentava distribuir um folder genérico impresso em P&B com o menu do restaurante para todos os pedestres que passavam a sua frente. Nesse caso, a panfletagem na porta do restaurante seria uma espécie de marketing massivo, genérico, aleatório e sem personalização. A grande maioria dos pedestres se recusava a receber mais um flyer a cada esquina, alguns pegavam e não paravam e muito poucos se interessavam no cardapio ou paravam para obter mais informações (1 a 2 %).



Alguns ficavam até ‘verdes’ de raiva ao ver tanto papel desperdiçado na próxima lata de lixo. Parecia mais uma intromissão, um obstáculo no caminho dos pedestres, mais uma mensagem bombadeada numa área, talvez visualmente a mais poluída do mundo – Times Square. O jeito ‘direto na jugular’ do Zeca, mais relevante, customizado e com timing certo na abordagem funcionava bem melhor.



Conclusão

A fragmentação da mídia em busca de maior individualização trouxe junto a necessidade de se fazer um marketing direto mais direto ainda, ou seja uma mensagem de conteúdo variável que aborde os benefícios mais relevantes para cada tipo de consumidor-alvo, no lugar de oferecer algo que não desperte interesse em comprar.



A mesma mensagem para todos nem sempre dá bons resultados e as empresas anunciantes, donas do dinheiro investido em publicidade, buscam novas práticas para aumentar o retorno do investimento feito em marketing. A época de comprar de market share qualquer custo deu lugar a uma visão mais inteligente para saber onde pôr o dinheiro e obter o maior retorno em vendas.



Ir direto ao ponto com uma mensagem relevante desperta maior interesse individual do que dizer a mesma coisa para todo mundo. Em outras palavras, falar diretamente dos benefícios que interessam a cada um gera mais resultados que falar de todos benefícios para todo mundo.



* Mauro Negrão é Presidente da DataWise.Marketing, Data Analytics & Marketing Intelligence.

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